segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Prosa Poética II

À PEQUENA Irmana

Minha amiga dos cabelos de feno deitados na face do vento, que dança com as palmeiras, lanço a mão do tabaco, na janela, da praça do monumento, as árvores trajam da noite, o luto. Um rouxinol rouco tinta suave, a rosa a ser ofertada e o fio da espada pela lua luzida dita os caminhos, que os peregrinos (querubins meninos) guardam...


Olho pro céu e aponto uma estrela, fazem um brocado bonito. O mar mansinho, soluça na areia, com os seus burburinhos, confidenciando-lhes segredos, fazendo meu peito a saudade tecer seu ninho, um Flamingo vermelho migra ao longe numa revoada...No gira – tomba, das rodas, nas cirandas, são meninas, são bacantes transfiguradas, nas flamas das braseiras e nas místicas cantigas pelas ondas embaladas ...

Emerge ao horizonte uma varanda pequenina, um Ipê que lançava seus galhos, nas teias de néon um arco-íris. E assim se fez o chão de um asfalto negro ornamentado numa tapeçaria de flores nevadas e, aos calcanhares tinha os estalidos apressados daquelas tardes de outono. O céu represava no seu escuro as lagunas de um Sol Laranja ...

Em nossas bocas úmidas de vinho floresciam jardins, serestas açucaradas, da lira acaricida, das notas entoadas coroávamos a noite de estrelas inocentes para nossos pretensos amantes...As angélicas da sacadas, Divinizadas nas praças, Princesas encarnadas, do alto da Torre jogam as tranças, na trama dos fios os sonhos enlaçados, sorrisos de crianças...

O tabaco, incenso no peito, um “frenesy de Pandemeni”...Incorpora, a vida ao espectro, nostalgia, como eram doces as calçadas, a fumaça no véu das bocas, o vinho telúrico irrigava os melodiosos cânticos, faunos dionisíacos bailavam ao redor, num deleitoso espetáculo...

E nas roda das saias das meninas desfilavam pavões forasteiros, condecorados com as honrarias e requintes, um nobre vagabundo cavaleiro ...

As divindades hindus, negramente contornadas as pérolas na face quase Santa...A rosa de Chanadú das calçadas com o perfume do Oriente, num passeio pela contra-mão dos estilhaços de cristal, sonham ainda nas contas de sal...

A voz do rouxinol arrancada, a rosa atropelada. Do chão brotaram os espinhos que protegem os ninhos das avoantes do sertão e nos cumes dos desfiladeiros por entre os rochedos, as águias fazem suas moradas...

Guardo as pétalas do girassol. As pás do moinho giram com o vento e engendram o tempo...Irmana das campanas, os rios têm seus cursos mas um só destino...

Minha embarcação de uma só vela acesa, mareia sem leme para o além-mar, vívidas são as estrelas, na barcaça seu capitão impunha aos Titãs uma espada de madeira.O vento redemoinha as madeixas, ressoam as videiras ondas..Estranho esse porto, tão salubre aos camaradas, essa pilhagem que é chamada saudade...



Andréia Reis.

domingo, 6 de janeiro de 2008

Prosa Poética I


Embaraçados Fados

“...Duas borboletas rubras doidas,
A tilintar as asas plissadas...
Destilam néctar dos Aires,
Na boca retirante dos amantes,
Balbucia o vento, às ondas do mar gentil,
Que embalam os sonhos dos pequeninos...”


Um cão que soluça por entre os becos ...

Línguas que rufiam e perfídias pelas venezianas das casas ...

Mariposas verdejantes bailam pelas ruas, luzidas pelas luas de mercúrios ...

Faz um frio fora, um frio das primeiras noites outonais ...daqueles que os supersticiosos se faz sentir ao corpo um calafrio, como se fosse um pressagio, um algo que ?...
As estrelas, pipas acesas dos amantes, sem linhas ou amarraras ...navegam com os navegantes, bordam no cobalto um tecido de tramas delirantes... Mirante dos meus medos a quem rezo minhas preces... Enredo meu destino...

Meus medos de enlouquecer, fadada ao desatino, que pelas noites sempre vazias tens a boca destilada e ressecada do fumo, desatina no peito, fina e latejante, a dor, uma cabrocha que baila no meu seio uma chaga em botão que desfolha incolor .... nuns orvalhos dormentes, dormentes da flor ...

Medo das palavras deitadas no vazio do ventre...do rouxinol a rosa, da rosa os dentes que estraçalham o seio que amamenta, que acalenta o espinho de carmim...Peço um incenso de jasmim, um mantra ao madarim. Um que cante as montanhas, as águas, às guerras, à paz e seus deuses habituais ...

Um medo de calar...calar no encerro, desta mal lograda que definha e amofina a mente, sempre estendida com doces pensamentos doentes...

Das tardes de primavera doiradas com um sol repousado no regaço azul tingido de diamantes que flutuam. Um pouco de terra fofa para os pés calcar, uma brisa que perfuma que põe os pulmões à vida que vem bem devagar, da gaivota de asas pardas que plaina branda...branda pelo ar ...

Medo de emudecer os olhos, cegar a voz e ensurdecer os sentidos...
Da tinta negra do tinteiro teço a alvura da folha minhas lamurias, versos ulcerais, porém tão gentis para com leitores, que com eles suspiram por seus vãos amores, mais traiçoeiros sóis que espreitas dos cantos guardados a pó, florescerá marasquino a descer pela goela uma rosa flamejante de erisipela...

Uma fina mortalha ornamentada de preces esquecidas cravejadas das lâminas dos punhais contrários ....Uma revoada de andorinhas cálidas ecoa pelo ar, malcheirosa a ladrar ....

Um casulo ao longe numa das galhas do pessegueiro a um tronco jaz apodrecido, as raízes fincadas a uma terra rancho... pulsante ao alpino do dia...
E a lebre branca e pequenina. Que saltita leve e macia com suas perninhas enrijecida pelo ar, contrastante com a verdura das planícies, as margaridas d’ ouro, os ciprestes de sinos azuis que adornam o leito da terra...

Enlouquecido, arde, pavorosa sinfonia dos gatos perdidos da rua das ferrovias ...escondo meus pecados cerrando os olhos a face marmórea... Meia –noite, sustenta o badalo, estrelas nuas fugidias...o cão leproso me sorri dum canto da casa...vem à matéria orgânica a pulsar, de língua rósea macia a percorrer os dedos, às palmas das mãos, acaricia o resto de carne pregado aos ossos, depositando a saliva decrépita das feridas em afeto prometido...

A minha arrogância? Ela sustenta-se em tua eminência provinciana...pras tuas perguntas? Não...Senão que lhe infligirei mais desgraças...Colocarei-te murcho defunto num vaso de lírios suplicantes, como um cabelo à porta que se abre em vão ...um vão momento, não rogai pelas minhas dividas! Rogai pela dúvida que sustenta a morte? Mas é o alheamento que sustenta a vida...Serei ressarcida a cova por Aquele ?...Não! Mil vezes contraria me mostrarei... Mas tu que tens que se mostra arrependido, de tua criação! ...Uma chuva de borboletas doidas? Não... Mas de borboletas glaciais para aplacares, mostre –me tua complacência diante das chamas do Ártico que me impele e louvarei minha face. Vejo aos meus olhos teu reflexo, olhos, reflexos, projeções de areia emolduradas as fagulhas de ferro braseiro.

A lepra do poeta está nas mãos. Os tentáculos abius da fiandeira que borda arco-íris nas árvores de forquilhas e véus de noivas que flutuam nas cumeeiras ...Mãos que escavam entranhas, que sustentam abismos, que peregrinas por desfiladeiros, que tateiam novamente entranhas...”Um topázio doirado se perdeu entre o mediterrâneo e o Egeu...” espalham macelas e suas arrogâncias, delírios em notas, sustenidos incestuosos de seus anseios... uma alma, tardia e ancestral pelos ventos...pelos mundos...inocente corrosiva aos versos cantados...Uma bailarina hemorrágica com os pés de estacas a solar sob o mar de Salazar, um doce fado ao mar de anil do exílio ...

...“...duas e duas...rubras ....rubras doidas...”...



Andréia Reis.